quinta-feira, 6 de abril de 2017

MEMÓRIAS DOS TEMPOS DO SANTO AFONSO - GUANO

No meu tempo de seminário, lembro-me dessa rua, lá em cima moravam os Prado, netos do Sr, Vitor Prado que trabalhava no convento, eram o Vitinho e os gêmeos. O pai, se não me engano, era Roberto Prado que trabalhava nas Oficinas Gráficas. Não me lembro do nome dos gêmeos, mas quero registrar um fato. Nos anos de 1952, mudamo-nos do Colegião para o Santo Afonso, ainda em construção, o terreno era aberto em todo seu redor, talvez houvesse uma cerca de arame farpado. Lá nos fundos, passava um ribeirão que vinha das encostas do Morro do Cruzeiro, águas já poluídas . A prefeitura providenciou um represamento com vistas à canalização, formou-se um lago fétido, foi apelidado de GUANO. Pois bem, certo dia, por volta de onze horas, a criançada do Morro de São João, resolveu invadir nossa área para brincar, não eram impedidos, pois conhecíamos todos, neles incluídos os gêmeos. Eis que, no refeitório, ouvimos gritos de socorro vindos dos lados do Guano, corremos para lá e deparamos com a criançada desesperada, pois um dos gêmeos entrara na lagoa e se afogara. Um seminarista mergulhou e retirou o menino das águas poluídas, infelizmente já morto. O seminarista, Gabriel Flores, posteriormente padre, levou-o nos braços, subindo esse morro e o entregou, consternado, a seus familiares. Estávamos no recreio pós refeição, quando Gabriel voltou e passou por nós, cabisbaixo, não quis se comunicar, subiu a escadaria talvez rumo à rouparia para pegar peças limpas e tomar um banho. Minutos depois, findo o recreio, subimos para a capela que, provisória, ocupava o futuro dormitório dos médios. Entramos em fila, eu era dos menores e fui um dos primeiros a chegar. A grande surpresa foi encontrar ali, nos últimos bancos, ajoelhado e com as mãos vedando o rosto, o Gabriel, ainda portando as roupas enlameadas. Talvez chorasse, talvez rezasse, possivelmente as duas coisas. Fizemos, então, conjuntamente, uma oração pelo menino que, infelizmente, Gabriel não conseguiu tirar vivo do GUANO. PS. - Gabriel Flores, irmão do padre Jesus Flores, chegou a se ordenar e, posteriormente, se afastou do ministério.
Alexandre Dumas Pasin de Menezes

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