sábado, 24 de setembro de 2016

Os trabalhos de cada um

NERI PEREIRA DA SILVA
- Já saiu a lista dos trabalhos? – perguntava um companheiro na hora do banho sob chuveiro de água fria. Nessa época não havia chuveiro de água quente para os seminaristas.
- Não, hoje é dia 30 e este mês tem 31 dias..sairá amanhã logo de manhã.
Cada seminarista tinha um trabalho no cuidado da casa durante o mês....a limpeza dos corredores ficava ao encargo de três seminaristas por andar...O corredor era enorme e largo...durante a semana apenas varríamos mas aos sábados passávamos ceras com pó de serra...sistema prático....enchia uma lata de dezoito litros com pó de serra e cera vermelha...despejávamos bem no início do corredor e em três seminaristas íamos varrendo a cera ao longo do corredor...ficava tudo limpo e encerado ao mesmo tempo. Haviam mais ou menos esses cargos: sineiro (normalmente era o monitor quem batia o sino chamando pros compromissos) , biblioteca, quartos (duas pessoas por mês), salas de aula, capela, jardins, banheiros, enfermaria, quartinhos dos armários, sala de visitas, isso tudo na hora da limpeza. A tarde havia os trabalhos fora do prédio e nesses também os responsáveis por cada espaço: horta, campo de futebol, quadras de futebol de salão, basquete, quadras de boccia, trilhas do bambuzal, caramanchão de flores, jardins...chuveiros e vestiários .
Eu, caipira do mato, nunca tinha visto uma quadra de boccia. Havia uma próxima ao campo de futebol ...num intervalo de aulas estava eu passeando por ali quando um seminarista pegou uma bola e gritou: " Chuta Neri ! " e atirou a bola que veio rolando em minha direção. Não pensei duas vezes, me coloquei em posição de chute e chutei com toda força...Duas semanas com o pé inchado sem poder calçar sapatos. Aprendi que aquela bola era de madeira e não era para chutar.
A cada semana era designada uma classe para fazer o trabalho de servir no refeitório , lavar as louças após a refeição, varrer e deixar a mesa pronta com os talheres e pratos para a próxima refeição. Chamavam-se " Equipe do Refeitório ", " Equipe da Cozinha "...Todos obedeciam fielmente a lista de trabalhos, com rara exceção um ou outro pedia prá mudar de cargo devido a fatores justos: alergia por exemplo. Lembro-me de um seminarista que desmaiava quando via e sentia cheiro de cera vermelha...esse nunca mais foi designado para a função de limpeza dos corredores.
Entre nós havia aqueles cargos que o padre pedia voluntários: cabeleireiro, sacristia , enfermeiros . Quem desejasse aprender a tocar algum instrumento musical teria que deixar o nome na lista com o monitor: violão, flauta, guitarra, contrabaixo , sanfona , saxofone, piano...e música...o Padre Libardi fazia testes com todos para a convocação pro coral: eu era tenor segundo...e o Padre Roberto Escudeiro ( diretor de nossa classe ) era o encarregado pelos espetáculos de teatro e pela fabricação das guitarras e contrabaixos.
Houve uma época em que começou uma criação de coelhos da índia pelos gramados do jardim, mas os coelhos se proliferaram tanto que um seminarista ficou encarregado de castrá-los: José Inácio de Medeiros, que certo dia foi me ensinar como se fazia a castração. Peguei um coelhinho e trouxe para ele. Então me orientou : 
-" Segure bem as patinhas e observe como faço pra castrar!"..
Agarrei as patinhas e ele com o bisturi fez a incisão mas o coelhinho gritou e se sacudiu todo escapulindo de minha mão. Saiu sangrando pelo gramado até o reencontrarmos e terminar a operação.

Então, vida de seminário não era mole não...acordar sempre no horário, tempo certo prá arrumar as camas e ir prá capela . Café da manhã e educação física sobre o gramado do campo mesmo em tempo de geada. Exercícios pesados, polichinelo, corrida, apoio ao sólo e outros sob a surpervisão de um sargento ou cabo...marcha unida...valeu a pena.Neri

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