1-O começo!
Era 1953...Órfão de pai há quatro anos, com nove anos de idade, uma irmã de dois anos menos e uma mãe que iria prosseguir na batalha da vida, agora sozinha, conduzida pela obrigação maternal de criar os dois filhos, dando-lhes o presente bem melhor que o passado, na perspectiva do futuro consistente sobre promissor . (....e ela conseguiu...)
Em contato com sua chefe, na creche do Lanifício Fileppo, indústria de tecidos no bairro do Belém, em São Paulo-SP, encontrou um lugar para deixar-me em tempo integral, isto é, internado. Era o Orfanato ( depois: Instituto ) Cristóvão Colombo, que está no bairro do Ipiranga, à rua Dr. Mário Vicente.Uma casa de padres carlistas, ordem cujo patrono é São Carlos Borromeo, que abriga por internato órfãos, direcionando-os para o caminho da Verdade e Vida!
Ali fiquei por quatro anos, continuando meus estudos do período primário e começando a aprender um pouco mais das coisas do Pai. Uma vez por semana, pegava o bonde em seu ponto inicial, em frente ao Instituto de Cegos Padre Chico, no Ipiranga, e ia até o seu final à Praça João Mendes, com destino à Igreja de Santo Antônio, na Praça do Patriarca, onde ajudava, durante o dia nas missas e outros serviços de sacristia como dar informações, vender velas, recolher o dinheiro deixado nas imagens e pedir às pessoas que não permanecessem nos degraus da entrada.
Comecei a conhecer ali que a vida, ainda que, decorrendo de forma precária, pode ser vivida com muita alegria e dignidade.
Esse modo de vida aliado à necessidade de liberar minha mãe para o trabalho trouxe-me até Aparecida-SP, ao Seminário Redentorista de Santo Afonso em 1957.
Foi vocação?
Entendo hoje que não. Mas a convivência nesta nova casa começou a germinar em mim o ideal missionário, no nascer de minha juventude:
SER PADRE, MISSIONÁRIO, REDENTORISTA, SANTO!
Em todos os meus movimentos estava sempre presente em forma falada ou escrita essa aspiração ( ainda agora ressoam essas palavras no timbre da voz do Pe. Brandão em meu consciente!).
Que coisa bonita! A vocação religiosa redentorista começava surgir!
Foi-me indicado um lugar para dormir e guardar minhas roupas e objetos...Mas isso era temporário....
2- Os dias na Pedrinha!
Que lembranças tenho daqueles dias...
Tinha vindo ao seminário para ficar internado, considerando que minha mãe precisava trabalhar após a morte de meu pai.
Fui para o PRÉSSA, PRÉ-SEMINÁRIO SANTO AFONSO, na Pedrinha.
A princípio, fiquei muito assustado por não ficar nos cômodos bem instalados do SSA, SEMINÁRIO SANTO AFONSO, em Aparecida. Temi por não conseguir acostumar-me viver num local tão isolado da cidade, meio frugal, zona campestre...Vi um campo de futebol com algumas árvores ao lado e piscina sem azulejos, com ilha de concreto no meio....
Dormitórios muito simples, poucos banheiros, refeitório escuro...Capela bem diferente....
Era a minha primeira impressão negativa, após ter conhecido o SSA.
De repente surge o Pe.Brandão, sisudo, circunspecto e nos fez a primeira preleção...Era o primeiro e inesquecível diretor!
Tudo designado, lugar na capela, no refeitório, no dormitório, no salão de estudos...comecei a ambientar-me...
Fui tomando gosto...A simplicidade de vida começou a fazer parte de meus sentimentos e o entusiasmo por isso ia brotando... PADRE,MISSIONÁRIO,REDENTORISTA,SANTO!
Era nosso ideal....Era nossa vocação....
Em seguida, conheci um padre que falava baixinho, óculos pendurados no nariz, cabelos meio encaracolados... era o confessor e orientador espiritual...o Pe. Antônio Borges....
De repente, surge um outro, um tanto discreto e até meio tímido, a princípio, seria o professor de matemática, o Pe.Fernandes....
Para completar, também de óculos, meio escuros, com as mangas da batina arregaçadas e olhar muito penetrante, era o Pe.Furlani, o ecônomo polivalente, era um “pé de boi”.
Esta equipe de orientadores daria início à minha formação cristã e cultural, quando estava saindo do período de infância...Que sorte! Que “time”! Com certeza foi o início perfeito para quem estava começando a escolher o que ser na vida...
Surgia a vocação religiosa naquela congregação que prima pela disciplina, obediência, pobreza e objetivo na conquista das almas, pelas missões...
Iniciamos nosso dia a dia, em meio ainda a retoques na construção e aos caminhões de areia do Sr.Geraldo, o basculante branco, que vinha ora de Aparecida, ora do Potim...Quantas vezes andamos naquela carroceria...
E assim seguiu nossa vida campestre...
No inverno era muito frio... Mas alguns tomavam banho às 5:30h da manhã na piscina e depois ficavam até de braços descobertos, porque a água parecia mais quente e adaptava nosso corpo à temperatura ambiente... Mas havia um ritual para conseguir-se essa façanha...Cinco minutos antes de soar o sino que nos despertava pela manhã naquela hora, debaixo dos cobertores, trocávamos a calça do pijama pelo calção de banho...Ao lado, dobrada e embrulhada na toalha, sobre nosso armário, ficava a roupa que iríamos nos vestir. Ao soar o sinal de despertar, levantávamos rapidamente, jogávamos na cama a camisa do pijama, pegávamos o “pacote” das roupas, correndo pelas escadas e por aquela descidinha da entrada, dirigíamo-nos até a piscina e sem parar um segundo, jogávamos ao lado as roupas embrulhadas e mergulhávamos na água. Se alguém parasse no meio do caminho, com certeza não teria coragem de pular na piscina. Às vezes deparávamos com uma cobrinha d’água, visto que era corrente de um regato que sobre isso, nos dava energia, supria nossa sede, mantinha a limpeza e era um dos principais “elementos” do “seu” Zosa... Lembram-se do Sr.Zosa? O homem do “mata-fome”(aquele pudim de pão nutritivo e pesado!) O nosso inesquecível cozinheiro...que, por tantas vezes, estava de pé às 3h da madrugada, preparando o nosso tutu de feijão para os passeios, aos Campos, Pedrona, Pilões e quando fazíamos a pé o trajeto de 15km até o SSA, em meio aquele eucaliptal que começava, mas demorava muito para acabar...
Falando em “seu” Zosa, lembro-me de da.Alzira, sua esposa, que cuidava da faxina, ajudava na cozinha e era uma “expert” em ervas... Uma vez, ao mergulhar na piscina, tive um impacto da água direto na orelha e a água entrou no meu ouvido. Este começou a doer talvez porque estava se iniciando um processo de inflamação... Era uma dor muito chata... A da.Alzira pegou umas folhas de uma plantinha que tinha ao lado de sua casa, ferveu-as, fez um caldo, embebeu o caldo num algodão e disse:
-Filho, vira a orelha!... Assustado, falei:
-Da.Alzira, se a dor que tenho é por causa da água que entrou, a senhora ainda vai colocar mais líquido no ouvido?
-Fica quieto menino e faça o que estou mandando...
Sem alternativa, obedeci e lá veio o caldo verde e quente...
De repente, no ato, a dor sumiu... Sumiu e não voltou mais...Os famosos chás e caldos da Da.Alzira...
Vinham os passeios pela serra.... Que passeios! Naquelas mochilas de caserna iam a comida e os respectivos utensílios... Em latas grandes redondas que foram de extrato de tomate era acondicionado o arroz e o tutu de feijão feitos pelas mãos sagradas do “seu”Zoza... Uma caixa grande de marmelada ou goiabada que seriam recortados e compunham a sobremesa. Era a mochila que ninguém gostava de levar: a caixa de madeira machucava as costas.
Equipados com roupa de campanha e uma bela bota, saíamos estrada e picadas afora, logo depois da missa diária, mas ainda muito cedo, quase madrugada...
Havia os Campos, que estão cerca de 2.000mt acima do mar, era um local dos mais altos da região. Andávamos um trecho em estrada e outro bom trecho em uma picada sinuosa que parecia nunca acabar e a paisagem ficava escondida por arbustos iguais, que nos davam a sensação de não sairmos do mesmo lugar. Sentíamos alívio quando ouvíamos os mais ligeiros gritarem
-Chegamos!
Alguns corajosos tomavam banho em águas daquele ribeirão cuja temperatura poderia ser de 6 ou 8 graus acima... Um pouco de descanso da jornada e , em seguida, formavam-se as turmas de 5 ou 6 juvenistas que iam fazer alguma aventura no local... Apenas aqueles que eram designados para a cozinha ficavam para preparar a refeição , que após abençoada pelo padre que nos liderava, era distribuída para a fila de jovens que pegavam os pratos de alumínio, os talheres e as canecas que serviam para receber a groselha geladinha, feita com água pura e cristalina do ribeirão. Um dia, nesse passeio, entrei na fila e fui pegando tudo o que havia: o arroz, o tutu, o ovo cozido, o pãozinho e a caneca de groselha.....
-Ufa, peguei quase tudo!
Assim dizendo e olhando para os demais, vi meu prato cheio escapar das mãos e emborcar no chão... Tinha de começar tudo de novo!(Ainda bem que não era necessário pagar!)
A volta era sempre mais fácil...só descida!
Na serra ainda havia os Pilões... Era um passeio que fazíamos apenas pela estrada, mas era mais longo... Até diziam que estava bem próximo da divisa de São Paulo e Minas Gerais.
Soube que em um desses passeios, um grupo de juvenistas ficou interessado em chegar à divisa, como tinha orientado o Pe.Fernandes. Esse grupo seguiu em frente em busca de um regato que atravessava a estrada que, segundo o padre, dividia os estados. O grupo foi em frente e alguns quilômetros adiante, chegaram ao “famoso” regato. Em meio a essa turminha havia um mineirinho, que passou por outro lado do riacho e começou a inspirar e expirar ruidosamente o ar... Ele sentia-se bem em estar no seu estado, Minas Gerais...
-Isto que é ar! Que ar puro! Melhor não existe! – e olhava ora o céu, ora o pessoal e batia levemente com as duas mãos socadas no seu peito...
Os demais admiravam a alegria do mineirinho!
Entretanto, passou por ali um morador daquela região que, por certo, deixava a roça para o seu almoço ainda matinal. O grupo cumprimentou aquela pessoa e confirmou-lhe que eram os “fios” do padre... Ao ser perguntado sobre a divisa dos estados, ele balançou negativamente a cabeça e disse:
-Óia, menino, a divisa ainda fica a uns 10km daqui...aqui ainda é Estado de São Paulo!
E o mineirinho? Cadê?
Tinha sumido já quando o campônio havia balançado negativamente a cabeça!
E as tardes de domingo....Formavam-se grupos de 5 ou 6 que saíam para as famosas pescarias... Alguns iam pescar lambaris na sensibilidade do peixe no anzol ao deixar seguir a isca na correnteza. Outros iam debaixo de uma ponte e pescavam carás. Aqueles que não eram tão habilidosos com as varas, deixavam a isca repousar no fundo do ribeirão e conseguiam pegar os famosos mandis de ferrão afiado. Mas havia aqueles que pegavam um saco de estopa e davam “batidas” nas margens do rio, conseguindo cascudos e camarões de água doce...Muitas vezes comíamos ali mesmo os camarões ainda crus. Uma vez pegamos uma traíra(dentuça!) que estava “dormindo”...(Não é mentira de pescador!). Depois, tudo na mão do “seu” Zosa era frito para a degustação dos pescadores.
Outra opção aos domingos era subir o Morro do Gigante que havia ao lado. (O gigante que estava deitado!)
Entretanto, às 18h todos tinham que estar na capela, devidamente banhados e trocados para a bênção do Santíssimo, ao som do Tantum Ergo!
Com a maravilha do mundo da internet hoje consigo ver mais completas as obras de Cornélio Pires. Sim, o autor das aventuras mirabolantes, destemperadas e grotescas de Joaquim Bentinho. Por que essa lembrança? Ah! O Pe.Fernandes.... Ele sentava-se numa das muretas do pátio interno, ficávamos sentados no chão em sua frente, ele abria um livrinho e lia:” ...JOAQUIM QUEIMA-CAMPO". É um caboclinho mirradinho, olhinhos vivos, barbica em três capões: dois de banda e um no queixo; bigodes podados a dente, desiguais e sarrentos; nariz de bodoque, aquilino, recurvo, fino, entre bochechinhas chupadas; dois dentões amarelos, os caninos, que só aparecem quando ri, quais velhos moirões de porteira abandonados; rosto em longo triângulo; cabeçudinho; cabelos emaranhados; orelhinhas cabanas, cada qual suportando o seu toco de cigarro, amarelentos e babados.De camisa, de algodão riscado, aberta ao peito, deixa ver pendurada no magro pescoço de cor de veias salientes, uma penca de "bentinhos", favas de Santo Inácio e patuás com rezas que servem para "fechar" o corpo e evitar mordedura de cobras.Baixinho, miudinho, desnalgado, perninhas finas e canelas luzidias, brilhantes ao reflexos do fogo, ao pé do qual nós reunimos todas as noites, o Joaquim Bentinho é um serelepe, espertinho e perereca... Observei que, como os outros roceiros, traz uma das pernas da calça arregaçada mais alta que a outra. Porque será? Depois de muito maturar, descobri que é para evitar que o enrodilhado de uma perna se esfregue no outro, ao ser mudado o passo, rustindo e estragando a roupa... Mas, vamos aos "causos"...
Era o nosso programinha de TV, ao vivo, acompanhando as mímicas engraçadas do saudoso Pe.Fernandes, quando, com muito entusiasmo nos lia aqueles trechos interessantes do autor! Quantas vezes ele leu esse trecho e para quantas pessoas!
O Pe.Brandão e os seus confrades de lá sempre temiam pela integridade física dos jovens...
Um dia veio uma gripe contagiosa contraída na região e parece-me que esteve em diversas outras partes do país...Chamamos: Gripe Espanhola! Quase todos os colegas ficaram acamados... Como não fui dela acometido, passei a ajudar os poucos, que estavam sãos, a levar remédios, comida e água aos que ardiam em febre... Foram momentos de muita apreensão.... Mas graças ao bom Deus, tudo passou sem quaisquer resquícios negativos... Todos sararam...e aí caí sozinho de cama... Uma vantagem: Tive muitos colegas disponíveis para cuidar de mim!
O Pe.Furlani, dirigindo a camionete..., ali vinha o nosso sustento...O Pe.Borges, a cavalo, ora dirigindo-se à vila de São Lázaro, para rezar a missa, ora mesmo na capelinha do bairro da Pedrinha, cuidando, para as pessoas de fora, dos assuntos de Deus.
Foram momentos inesquecíveis e muito oportunos para nossa formação. Éramos do PRÉSSA e sonhávamos o SSA, em Aparecida, depois o noviciado em Pindamonhangaba e finalmente Tietê, o seminário maior.
3-O SRSA-Seminário Redentorista Santo Afonso
É a casa para formação dos missionários redentoristas, aos pés da Padroeira da cidade, Nossa Senhora Aparecida.
Lá cheguei para ficar por mais cinco anos, completando ainda três anos de ginásio (primeiro grau), considerando que tinha cumprido meu primeiro ano na casa da Pedrinha, e mais três anos de um misto de Clássico/Científico (segundo grau).
Ali os estudos eram intensos e havia muito rigor no ensino das matérias. Aulas diárias de português e latim. Aprendizado de línguas como o francês, inglês e até o grego! A matemática englobava a aritmética, a álgebra, geometria e trigonometria. Além disso tudo a física e a química com suas fórmulas e experimentos...
O Padre Rodrigues, José Rodrigues de Souza, era o professor de português. Baixinho e magrinho, de cabelo penteado como típico argentino. Mas escrevia no espaço total do quadro negro, ainda que necessitasse ficar nas pontas dos pés e depois sair com resíduos de giz na ponta do nariz. Sua letra era muito bonita. Era exigente e gostava de corrigir com caneta de tinta bem vermelha, chamando a atenção para os erros. Às vezes havia mais vermelho do que azul, após a correção da lição de casa. Ele ajudou o Professor Napoleão Mendes de Almeida a fazer a GRAMÁTICA METÓDICA DA LÍNGUA PORTUGUESA.
O Padre Azevedo, além de ser o meu confessor espiritual, era o professor de Latim. Muito consciente e preciso na matéria, com base no manual ARS LATINA, passava-nos o conhecimento da língua morta que estava presente em todas as celebrações religiosas e nos breviários de orações diárias que eram cumpridas por todos os padres religiosos.
A matemática ficava por conta do Padre Cherubini, que tinha muita afinidade no mundo da física e química. Era um brilhante professor...um cientista!
O Padre Isidro, por meio do MY ENGLISH TEACHER e do YASIGI METHOD, ministrava-nos o conhecimento da língua inglesa e o francês ficava por conta do Padre Vitor Hugo.
O Padre Peixoto mostrava-nos os caminhos das plantas pela Botânica.
Os conhecimentos de História Geral eram transmitidos pelo Padre Carlos Silva. Aqui uma lembrança especial: o Padre Silva ficou pelo menos três meses ensinando sobre Napoleão Bonaparte, de quem era um fã decidido! Conta-se ainda que o Pe. Silva desenvolvia particularmente estudos sobre fenômenos científicos, como a “transmissão de pensamentos”. Dizem, após ter saído do seminário maior em Tietê, já sagrado sacerdote, tinha ainda de continuar estudos sobre a História da Igreja e Teologia ainda por cinco anos, ao mesmo tempo que desempenhava suas funções sacerdotais. No final de cada ano, eram enviadas, pelos teólogos do seminário maior de Tietê, as questões no sentido de fazer a complementação dos estudos. Em uma dessas ocasiões na conversa de recreio, o Pe. Silva falou a um confrade que conseguiria saber por antecipação, isto é sem qualquer informação da equipe examinadora e antes mesmo do conhecimento do Padre Penteado, então reitor do SRSA, quais seriam as questões definidas em Tietê, apenas precisava saber o momento em que estariam sendo elaboradas.
O confrade duvidou e, com a devida anuência do Pe. Silva, falou com o padre reitor sobre aquele assunto. O Pe. Penteado, quando tinha as questões em mãos, chamou o Pe. Silva e solicitou-lhe que informasse seu conteúdo.
O Pe. Silva, sem qualquer conhecimento prévio da prova, mencionou ao Pe. Penteado as 5 perguntas ficando apenas uma inversão entre a 4ª e a 5ª.
Ao consultar os examinadores de Tietê, o Pe.Reitor soube que foi cogitado o cancelamento da 4ª questão, mas isso não foi efetivado e o que antes era o item 4 passou a ser 5 e vice-versa. Conclusão: o Pe. Silva havia acertado inclusive a ordem inicial das perguntas. (Em 2008, ao participar do XIII ENESER, tive a confirmação direta do Pe. Silva desse fato!)
Época de campanha eleitoral, 1.962....
Em cena, os candidatos ao governo paulista:Jânio da Silva Quadros, José Bonifácio Coutinho Nogueira, Dr. Adhemar de Barros.
Os candidatos visitavam os padres para pedir apoio....
Em geral, foram recebidos com muita cortesia e até pompa.....
O Sr. Jânio atrasou sua chegada, como de costume, em 2 horas....mas foi muito bem recebido e falou muito da sua reconquista ao poder.....
O Sr. José Bonifácio, candidato de coligação grande, PR-PDC-UDN-PTB e PRP, com o apoio direto do então governador Carvalho Pinto, que se colocara contra o seu criador, o Sr. Jânio Quadros, tinha a simpatia do clero e andava sempre ao lado do então governador.
Mas o Dr. Adhemar de Barros foi recebido friamente. Lembro-me muito bem que apenas um dos padres, o Pe. Carlos Silva, via no Dr. Adhemar o político consistente que daria mais tranqüilidade ao país, após a irresponsável renúncia do Presidente Janio Quadros...
Ninguém queria gravar o discurso do Dr.Adhemar.
Fui ao Pe. Carlos Silva, pedi que arranjasse um gravador e, com muito orgulho, gravei as palavras daquele grande estadista, segurando ao seu lado, bem pertinho, o microfone e aí ouvi algo muito interessante naquela campanha.
O Dr. Adhemar começou sua preleção dizendo que sua campanha era uma campanha de revolta....Ele queria segurar o "demônio" pelos chifres, referindo-se ao candidato oposto Sr. Jânio Quadros. Explicou que tinha oferecido ao Professor Carvalho Pinto apoio ao seu candidato Sr. José Bonifácio, que ainda considerava imberbe, uma “tenra criança” que teria muitas dificuldades para enfrentar a grande fera(Sr. Jânio). Mas o Prof.Carvalho Pinto não aceitou o apoio do Dr. Adhemar.
Assim, ele partiu para uma campanha isolada, sem apoios, contra tudo e todos, inclusive não recebendo o beneplácito da igreja católica.
Venceu, segurou os chifres do "demônio" e mostrou o "beabá" da política ao inexperiente Prof.Carvalho Pinto, que se tornara governador apenas graças ao eleitorado robusto do Sr. Jânio Quadros....
Foi o meu primeiro voto....comecei muito bem....Sempre orientado pelo Pe. Silva que munia as exposições periódicas com as notícias sobre o Dr. Adhemar.
Nossos horários compreendiam as missas diárias e orações, estudos com aulas em tempo integral nas segundas, quartas e sextas e em meio período nas terças e quintas. Tínhamos nossos momentos de lazer com jogos de futebol ou vôlei nas tardes de terças, quintas e sábados e nos domingos fazíamos algum passeio ora na Fazendinha, ora no Potim ou mesmo na visita ao novo santuário que começava surgir.
Num desses passeios à Fazendinha que ficava em Aparecida, do outro lado da via Dutra, lembro-me que voltava pela estradinha de terra na companhia de mais ou menos 20 colegas....
De repente ouvimos um grito estridente do caseiro da fazenda:
-OLHA A VACA BRABA!
Olhamos para trás e realmente vimos uma vaca pretinha, de cabeça abaixada e chifres em riste, dirigindo-se arfante e bufante à nossa direção.
No mesmo momento, todos saíram da estrada, passando pela cerca de arame.
Quando o caseiro domou aquela rês e nos devolveu a tranqüilidade, tentamos voltar à estrada pelo mesmo local de onde tínhamos atravessado. Mas como? A cerca era alta e o espaço entre os arames farpados era bem menor do que nossos corpos. Ficou-nos uma dúvida para qual até hoje não consegui explicação:
-Como saímos da estrada por aquela cerca alta e de arames farpados, colocados muito próximos uns dos outros, deixando pouco espaço para nossos corpos? E, mais intrigante, como não tivemos um único arranhão naquela hora de desespero?
Dizem que foi nosso instinto de conservação.....
Mas ainda sobre esses passeios, o Pe.Neri contou-nos uma historinha muito interessante. Tratava-se de um colega de sua época de nome Lancelote.
Em uma ocasião, quando saíram a passeio, o menino teve vontade de ir ao banheiro. Mas eles estavam no meio do mato e ali só havia moitas.
O Lancelote foi para trás de uma moita para poder fazer sua necessidade.
De repente surge uma vaca que começou a comer as folhas próximas da moita e da própria moita.
O Lancelote, não sabendo do que se tratava, ouvindo barulho muito próximo e percebendo movimento, levantou a mão, gritando:
- HEI! TEM GENTE!
Às tardes de domingo jogávamos futebol. A turma dos menores, no seu campinho que ficava entre o muro da rua e o campão dos maiores. Num patamar superior, à esquerda do campo dos maiores, estava o campo médio da turma dos médios. Era tudo muito proporcional.
Algumas vezes nosso time dos maiores, que contavam com bons jogadores principalmente do Amazonas e de Goiás, jogavam com algum time de fora. Até um time reserva da cidade de Aparecida veio uma vez e, como não poderia ser diferente, sob o comando do famoso titular Charles, venceu nossos colegas.
Quando festejávamos a festa de Santo Afonso, foi organizada um jogo de futebol entre padres, inclusive os do santuário, e os nossos seminaristas maiores.
Os seminaristas venceram.
Entretanto, foi muito marcante o momento de que nunca vou me esquecer. O Pe.Vitor Coelho de Almeida, que estava presente entre a torcida, de repente pediu para entrar no jogo. Arregaçou as mangas, prendeu as pontas da batina no cinto do rosário e foi para a área participar de um escanteio a favor do time dos padres....Adivinhem....
Ele fez o gol de cabeça....deu um pique feliz e saiu de campo realizado....afinal seus pulmões não aguentavam muito.....
A VOCAÇÃO SACERDOTAL
Foram 6 anos no seminário.
Tive um confessor no seminário, o falecido Padre Azevedo Tofuli, meu professor de Latim, que mensalmente, por um contato direto, ouvia-me em colóquio e pelos seus conselhos orientava-me em meu caminho ao sacerdócio. Esse franco contato levou-nos à conclusão um dia de que minha verdadeira vocação seria a formação de uma família ao invés de um compromisso pelos votos religiosos. Foi pelo seu conselho que saí do seminário e formei minha família , constituída e realizada, que já trouxe ao mundo três filhos e quatro netos.
Era o caminho que devia ser seguido!
Antônio Ierardi Neto
Ierardi, a história é a mesma..só mudam data e o nome. ...eu entrei em 1959...Lembro-em bem da visita dos políticos, do Pe Victor jogando bola com a gente e tudo mais. Excelente. (já disse alguém: recordar é viver) Eu vivi todos estes fatos, porém acredito que nesta época 1962 começava nos menores. A única diferença foi o professor de latim que era o Pe. Magalhães e a presença do Pe. Zômpero. Realmente, para mim o Pe. Silva foi um diferencial em suas aulas de história. Conseguia formar os grupos que se dividam em fãs dos grandes "generais" da história os fãs de Atila, Rei dos Hunus (eu), Aníbal, Alexandré, o Grande, Genjiscan e tantos outros... Além das maravilhosas aulas sobre o Egito.Ivanir Vicári
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