domingo, 6 de dezembro de 2020

MOMENTO DO JOSÉ CARLOS CRIADO

Como tenho "mania" de registrar tudo, escrevi sobre nosso passeio de curso no Rio de Janeiro. Meu encerramento do colegial, em 1968, foi coroado com um passeio, com todos do curso, para o Rio de Janeiro, levados pelo Irmão João Bosco, e ficamos hospedados em um convento de freiras no Alto da Tijuca. Neste período, estava ocorrendo em um cinema local uma amostra de cinema de arte, quando comecei, junto com Rubens e Torati, amigos de curso, a apreciar Buñuel, Godard, Bresson e Bergman. O passeio, ao Rio foi de 18 a 27 de julho/1968. No dia 29 escrevi para meu pai uma carta relatando tudo o que vimos e vivemos. O que mais ficou marcado para mim foi a visita ao Museu Nacional, onde fomos mais de uma vez e onde ficaria mais tempo, não tivesse chegada a hora de sair. Em uma carta enviada aos meus pais, escrevi: “O passeio foi muito proveitoso para todos nós pois entramos em contato com outras mentalidades e outros ares do Brasil o que vai ajuntando experiências e conhecimentos cada vez maiores da vida com todas as suas variações. Passamos por diversas aventuras que se fossem escritas caberiam num livro. Logo no dia em que chegamos ficamos sabendo que a casa onde pousaríamos estava sendo restaurada e fortificada pelo Governo e não se permitia ninguém por lá. Até que com muito custo e medo de voltar, as irmãs Marcelinas conseguiram para nós uma escolinha e uma garagem de carro. Arranjamo-nos como pudemos e no fim todos estavam gostando do “nosso Hotel”. Nossas refeições fazíamos no refeitório das irmãs Marcelinas, comendo das mais saborosas comidas. Admirei muito estas irmãs, pois a finalidade delas é a educação, desde crianças pequenas até grandes. Têm mais de 200 alunos e alunas entre internos e externos. São 40 irmãs e como elas mesmas nos disseram, ainda são poucas para tanta criança (que exige “aquele trabalho”!) Entre os lugares que visitamos figuram: Corcovado, Pão de Açúcar, Cais, Aeroportos do Galeão e de Santos Dumont, 9 Igrejas antigas, 5 museus de renome, Maracanã, Zoológico e as praias de que o Rio está cheio. Fomos 4 vezes à praia, cada dia numa: Copacabana, Arpoador, Tijuca e Ipanema, mas quase ninguém se queimou, apesar do sol. À noite íamos para o cinema ou teatro. No teatro estava em cartaz a peça O burguês Fidalgo, de Moliére, tendo como principal artista o maior do Brasil em teatro: Paulo Autram. O que mais admirei no carioca era a sua comunicabilidade com todos. Por não conhecermos o Rio, tínhamos sempre que pedir informações e o carioca sempre sorridente, calmo, amante de uma conversa, pedia um cigarro, acendia e ainda sorridente dava a informação, na maioria das vezes, errada. Em quase todo lugar que íamos, encontrávamos um grupo de estrangeiros, ora alemão, ora inglês, americano, israelita e de outras línguas que eu não conseguia decifrar. O lugar em que mais me diverti foi na ilha de Paquetá, distante 1 hora de lancha a vapor. Nesta Ilha, o único veículo permitido é a bicicleta. Sua topografia é quase plana, facilitando com que até os velhos e velhas se locomovessem de um lugar ao outro de bicicleta. Alugamos em três uma barquinha de pedal e com ela quase nos perdemos por ser difícil o manejo para principiantes. Tiramos uns 3 filmes de fotografia que devem estar sendo revelados agora. Na volta passamos pela Igreja da Penha, edificada sobre rocha e tem 581 degraus cavados na pedra, para se alcançar a porta da Igreja. É esta do cartão que mando junto a esta. Enfim, achei a cidade do Rio como todos acham, maravilhosa. Vale a pena ser visitada. Porém, há mais beleza na topografia do que das pessoas, isto é, grandes e esplendorosos prédios ao lado de um morro coberto de tábuas e latas onde vive gente. As grandes favelas do Rio deixam a gente de boca aberta. Milionários ao lado da pobreza. Agora, com todas estas experiências e conhecimentos, vamos iniciar a segunda etapa do ano, mais encorajados e dispostos, pois vimos a desgraça humana, a ignorância, a pior do povo brasileiro e desejamos servir a Cristo no próximo. O Pe. Brandão e Pe. Rodrigues desembarcam hoje em Santos, vindos de Bruxelas, onde se formaram. Irão trabalhar nas missões redentoristas de Araraquara ou S. João da Boa Vista, ainda não sei certo. A respeito de nosso noviciado parece que a coisa mudou mesmo. Agora é mais certo que receberemos batina e que faremos 6 meses de noviciado em S. João da Boa Vista. Só esperamos que a decisão seja a melhor. Rezemos para o Espírito Santo que nunca falha. Farei o retiro, agora nos dias 3, 4 e 5 para em seguida voltar às teorias dos livros. Ainda não sabemos como será este retiro, pois fizemos um pedido de que fosse feito de tal modo que em lugar daqueles longos silêncios, houvesse algum tema para ser debatido em pequenas equipes. Agora somente esperamos que seja determinado o melhor modo para que nos abasteçamos o suficiente até a próxima vez, já como noviços, se Deus nos aceitar como somos. A “Cartinha” foi enviada durante as férias, mas como havia pouca gente para despachar, só fizeram a metade e creio que aí em casa não foi. Não sei se mandarão fazer mais agora, ou não pois, já se foi muito tempo. Aqui não encontrei nenhum exemplar. O “Santuário de Aparecida” já foi pago logo que cheguei daí, e junto seguem os recibos. Espero que estejam em ordem. Do dinheiro do passeio sobrou bastante, pois nossa campanha deu mais de 100 cruzeiros novos a mais do que precisamos. O Pe. Diretor nos deu 10 mil para cada um e o resto ajuntou ao dinheiro da pensão das irmãs, que nos haviam cobrado apenas NCR$0,50 cada refeição, quando nestas refeições, vinham os pratos mais diferentes e saborosos à vontade, Ao todo gastei uns NCR$25,00.” O Noviciado foi definido para ser no Potim e com duração de um ano. Durante todo o ano de 1969, o grupo se recolheu em retiro espiritual de preparação para os votos redentoristas, no Seminário do Potim, situado em uma fazenda próxima de Aparecida, sendo denominados como “noviços” e chamados de “frater”, cujo mestre era o Pe. Leardini. Nosso nome, a partir daí, seria sempre precedido de “Fr”, abreviatura de frater. Assim, passei a assinar como Fr. José Carlos Criado.

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